Como está a sua saúde mental? Sente-se com ansiedade? Novo estudo indica que os efeitos psicológicos da pandemia continuam presentes. O que fazer para conseguir alívio e serenidade no dia a dia?
No dia 10 deste mês, celebrou-se o Dia Mundial da Saúde Mental. A data, criada no início dos anos 1990, serve de alerta para governos e sociedade sobre o seguinte fato: a saúde somente está completa quando ela envolve também o bem-estar mental. Ou, conforme explica a Organização Mundial da Saúde (OMS)…
“saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença ou enfermidade”
A data é especialmente importante após a pandemia da COVID-19. Apesar do número de casos da doença ter começado a diminuir substancialmente em 2021, foi somente em 2022 que muitas pessoas puderam finalmente respirar mais aliviadas e considerar que os maiores perigos já haviam passado. As restrições diminuíram. A vida parecia que voltava ao normal. Apesar disso, os efeitos psicológicos destes últimos 02 anos continuam fortes e presentes. Para ajudar a entender o impacto da pandemia na saúde mental das pessoas, vale a pena analisar os dados de um novo estudo, publicado agora em outubro no periódico científico ‘Journal of Affective Disorders‘ [1]. Analisamos os principais resultados a seguir.
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Pandemia do coronavírus e a saúde mental
A pandemia da COVID-19 não foi fácil. Além dos enormes problemas de saúde causados pelo novo coronavírus, as pessoas tiveram que se preocupar com diversas novas e complexas questões econômicas e sociais, de alto impacto no bem-estar e no equilíbrio mental, como por exemplo:
- quarentenas,
- fechamento de comércio e de negócios,
- fechamento de escolas e instituições de ensino,
- impossibilidade de trabalho fora de casa,
- impossibilidade de viajar,
- distanciamento social,
- isolamento,
- hospitais e serviços de saúde lotados,
- insegurança financeira,
- insegurança com relação ao emprego,
- problemas econômicos locais, nacionais e internacionais,
- risco de contaminar parentes e amigos, dentre outros.
O resultado de tanta pressão foi um aumento dramático de diagnósticos de transtornos psicológicos nos últimos anos, observado em todos os continentes. Em especial, os casos de depressão e de ansiedade dispararam – estima-se um aumento de cerca de 25% no número de casos em todo o mundo -, acompanhados de outros problemas como estresse psicológico, insônia e estresse pós-traumático.
De acordo com a OMS [2], atualmente cerca de 20% das crianças e dos adolescentes convivem com algum problema de saúde mental. Para se ter uma ideia, as ideações de suicídio são a 2ª maior causa de mortes na faixa etária dos 15 aos 29 anos.
Estudo encontra picos de ansiedade e depressão no mundo
Com base em uma meta-análise de quase 400 artigos científicos publicados nos últimos 02 anos, que entrevistaram mais de 170 mil pessoas em todo o mundo, os autores do novo estudo analisaram os efeitos psicológicos da pandemia em populações de diversos países e encontraram padrões que podem ajudar a determinar políticas de saúde direcionadas a tratar estas questões.
Os dados mostram que os casos de ansiedade e de depressão atingiram o pico em maio de 2020, época ainda ‘inicial’ da pandemia, em que não havia vacinas prontas e pairava no horizonte mais dúvidas do que certezas sobre a doença (sem contar o número de mortes pela COVID, altíssimo à época). Os casos foram diminuindo ao longo do ano e de 2021, mas ainda hoje se mantêm mais altos do que no início da pandemia.
Em termos globais, é interessante notar diferenças regionais nos resultados. Dentre os problemas de saúde mental analisados pelo estudo, as maiores taxas de ansiedade, depressão, estresse pós-traumático e solidão foram observadas em pessoas na América do Norte. A prevalência de estresse psicológico foi maior na América Latina (dados do Brasil foram incluídos no estudo), e de insônia na Europa.
SER MULHER DURANTE A PANDEMIA
Dados globais mostram que as mulheres sofreram mais psicologicamente nos últimos anos, com taxas mais altas de ansiedade e depressão, do que os homens. Isso pode estar relacionado ao fato de que, durante a pandemia, as mulheres foram mais susceptíveis à perda de emprego, a serem obrigadas a deixar o trabalho para cuidar de parentes/filhos (ou manter o trabalho e também cuidar de parentes e filhos que estavam doentes ou não podiam ir à escola), à exaustão por quantidade de tarefas profissionais ou em casa, dentre outros fatores.
O que explica a prevalência destes problemas de saúde estar alta até hoje? Uma possível interpretação dos resultados é a de que as sucessivas ‘ondas’ de COVID-19 nos últimos anos tiveram um efeito psicológico severo na população. Afinal, quando os números de infecções e de mortes pela doença pareciam que estavam melhorando, surgia uma nova variante perigosa (como a ômicron), ocorria novo pico de casos, e o estresse se intensificava. Além disso, é claro, a doença continua afetando milhares de pessoas, e quem sofreu os sintomas da doença, ou teve que cuidar de alguém que se contaminou com o vírus, bem sabe o quão difícil foi (e é) lidar com a COVID.
Em vista deste cenário, é hora de agir. Os pesquisadores indicam que os sistemas de saúde precisam estar atentos para esta nova realidade e levar em consideração que os efeitos psicológicos da pandemia possivelmente perdurarão ainda por alguns anos. Condições mentais tem um efeito substancial em todas as áreas da vida, como na performance escolar ou no trabalho, no relacionamento com a família, colegas e amigos, além de comprometer a capacidade de convivência saudável em sociedade. A OMS estima que os efeitos da depressão e da ansiedade custam mais de 1 trilhão de dólares anuais à economia mundial. Apesar disso, governos investem menos de 2% do orçamento de Saúde para a saúde mental. Isso precisa mudar.
O que você pode fazer para reduzir a ansiedade e melhorar a saúde mental?
Uma das dicas mais importantes é conversar com um profissional sempre que perceber que a saúde mental esteja causando prejuízos em todas as esferas da vida, ou seja, no âmbito bio-psico, social e espiritual. Isso porque o profissional poderá te ajudar a compreender quais são as principais fontes de ansiedade, preocupação ou traumas em sua vida. Identificando-as, é possível trabalhar sobre cada uma delas, encontrando soluções para as dificuldades e caminhos para que os problemas possam ser resolvidos, deixando de ser apenas pesos psicológicos.
Outra dica fundamental é separar um tempo ‘para você’ todos os dias, livre de distrações ou de atividades que possam causar estresse. Para muitas pessoas, um tempo ‘analógico’, longe de telas, redes sociais e serviços de streaming, já ajuda a diminuir os níveis de ansiedade e permite focar em atividades mais prazerosas. Nesse ‘tempo para você’, vale a pena também investir em exercícios físicos – inúmeros estudos já comprovaram que mesmo os exercícios mais leves, como caminhadas, ajudam a melhorar o humor, a saúde mental e do corpo como um todo, com efeitos prolongados.
Por fim, uma dica importantíssima, mas que poucas pessoas dão valor ultimamente: tenha uma boa noite de sono. Neste ponto, também há inúmeros estudos científicos demonstrando o quão importante é dormir bem para a saúde do corpo e da mente. Noites bem dormidas ajudam desde o sistema imune a funcionar melhor até o cérebro a reter e processar mais efetivamente informações. Os efeitos positivos de médio e longo prazo de uma rotina de, ao menos, 06 a 07 horas diárias de sono, são impactantes, assim como os efeitos negativos de poucas horas de sono por noite. Antes de dormir, evite telas, refeições substanciais, atividades estressantes ou muito agitadas. Considere a hora de dormir como ‘sagrada’, reservando o devido tempo para o sono todos os dias
Os últimos anos não têm sido fáceis. E, certamente, novos desafios surgirão no futuro. Estar preparado para eles nem sempre é possível, mas é importante lembrar que a saúde do corpo e a saúde da mente andam sempre juntas, e ambas precisam ser tratadas com o mesmo carinho.
Para saber mais:
- Jude Mary Cénat, Seyed Mohammad Mahdi Moshirian Farahi, Rose Darly Dalexis, Wina Paul Darius, Farid Mansoub Bekarkhanechi, Hannah Poisson, Cathy Broussard, Gloria Ukwu, Emmanuelle Auguste, Duy Dat Nguyen, Ghizlène Sehabi, Sarah Elizabeth Furyk, Andi Phaelle Gedeon, Olivia Onesi, Aya Mesbahi El Aouame, Samiyah Noor Khodabocus, Muhammad S. Shah, Patrick R. Labelle. The global evolution of mental health problems during the COVID-19 pandemic: A systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Journal of Affective Disorders, Volume 315, 2022, Pages 70-95, ISSN 0165-0327. https://doi.org/10.1016/j.jad.2022.07.011.
- https://www.who.int/health-topics/mental-health
- OMS: World mental health report: Transforming mental health for all (https://www.who.int/publications/i/item/9789240049338)