Durante o inverno, aumentam os casos de olhos secos, causando sensações de dor e irritação ocular e reduzindo a qualidade da visão. Entenda o que é esse problema tão comum e o que fazer para evitá-lo.
Dentre os nossos sentidos, o da visão é um dos mais relevantes para o dia a dia. Tanto é que, se há uma parte do corpo que protegemos de forma rápida e ‘instintiva’, esta são os olhos – é mais que natural colocarmos, por reflexo, as mãos em frente ao rosto em situações de perigo, ou fechar os olhos de forma ‘automática’ para protegê-los de acidentes.
Tudo isso porque os olhos, apesar de importantes, são órgãos extremamente sensíveis – um mínimo grão de areia pode provocar intensa irritação e comprometer a qualidade da visão. Mesmo a qualidade do ar ao nosso redor também impacta o bom funcionamento ocular.
Não é de se estranhar, portanto, que durante os meses mais frios do ano – quando a qualidade do ar piora de diversas maneiras – o número de problemas oculares também aumenta. Dentre eles, um dos mais comuns e impactantes são os olhos secos.
Sinais e sintomas do olho seco
‘Olhos secos’ pode parecer um termo popular, porém reflete uma questão séria de saúde, considerada como uma doença.
Trata-se de um termo bastante amplo, que abarca uma série de sinais e potenciais causas, mas no geral é caracterizado por sintomas que envolvem dor nos olhos e piora na qualidade da visão, decorrentes da falta de lubrificação. A lubrificação ocular é naturalmente proporcionada pelas lágrimas; se elas não estão presentes na quantidade ideal, os sintomas de olho seco aparecem.
A ‘dor’ nos olhos secos pode ser relacionada a sensações de ‘secura’ ocular, de ‘ardência’ ou de ‘irritação’. Em alguns casos, o paciente tem a sensação de estar com ‘grãos de areia’ nos olhos, o que torna até o ato de piscar bastante doloroso. Além disso, outros sinais comuns são coceira intensa (e que não passa mesmo ao se coçar os olhos), sensibilidade à luz, visão embaçada e vermelhidão.
Toda mudança percebida nos olhos gera preocupação. Sensações estranhas, também. Por isso, o olho seco é um dos problemas oculares que mais levam as pessoas a procurar ajuda profissional.
Olho seco e inverno: dois fatores que estão sempre juntos
Estar com olhos secos é uma condição bastante comum. Existem diversos graus de severidade, assim como possíveis causas e desencadeadores, como veremos a seguir. Agora no inverno, quando o tempo costuma ser muito seco (ou seja, a umidade do ar está baixa) em boa parte do Brasil, não é incomum o número de casos aumentar.
Quando o tempo está seco, a falta de umidade no ar faz com que as lágrimas que naturalmente hidratam os olhos evaporem mais facilmente. Isso deixa os olhos mais vulneráveis e aumentam a sensação de ‘secura’, assim como reduzem a proteção contra partículas externas.
Além disso, agora no inverno, não é incomum as pessoas ‘se esquecerem’ de uma hidratação correta (em outras palavras: beber água!), o que também pode contribuir para os sintomas.
Para piorar, em algumas regiões do país, o inverno chega com uma mistura de ar gelado, sujo (já que chove pouco) e com muito vento – mais um complicador para a saúde ocular! Além de ajudar a ‘ressecar’ os olhos, o vento favorece também o contato com elementos irritantes, como poeira, pólen, areia e pequenas partículas.
Pelos motivos acima, fica fácil entender por que pessoas que trabalham em ambientes com ar-condicionado também possuem chances maiores de ter olhos secos: frio, corrente de ar e baixa umidade!
Em alguns países, como os EUA, as especificações de uso de ar-condicionado levam a saúde ocular em consideração, e sugerem que o ambiente fique entre 20ºC e 25ºC – uma das razões é justamente evitar um ambiente muito seco e frio, que pode prejudicar os olhos.
Em outras palavras: o inverno é um ‘prato cheio’ para desencadeadores do olho seco. O importante é saber como evitá-los e proteger a saúde de um dos órgãos mais relevantes do nosso corpo, mesmo durante essa estação complicada. É o que veremos a seguir.
Olhos secos: o impacto da quantidade (e da qualidade) das lágrimas
Os olhos estão permanentemente protegidos pelas lágrimas – as mesmas que escorrem quando estamos tristes. Normalmente, são produzidas em quantidade suficiente para recobrir os olhos, lubrificando-o (para que o ato de piscar ocorra sem dificuldades) e protegendo-os contra ações externas. Ademais, elas formam uma barreira natural contra infecções oculares, nutrem as células da córnea e ajudam no processo de ‘limpeza’ do olho (é por isso que lacrimejamos quando um grãozinho incômodo atinge nossos olhos).
Quando piscamos, as lágrimas são espalhadas por toda a superfície do globo ocular de maneira mais ou menos uniforme, formando uma camada protetora chamada de filme lacrimal.
O corpo humano é um sistema tão ‘avançado’ que até mesmo o filme lacrimal possui enorme complexidade! Ele é formado por diversos componentes, como lipídios, proteínas, vitaminas e minerais, organizados em três ‘camadas’. A camada central é a mais espessa, formada basicamente por água. A camada mais externa, por sua vez, é composta principalmente por lipídios e tem a função de reduzir a evaporação da parte aquosa sob ela. Já a camada mais interna possui componentes que a ajudam a ‘grudar’ no globo ocular.
Contamos em detalhes sobre o filme lacrimal por uma boa razão. O olho seco pode ser tanto decorrente da baixa quantidade de lágrimas quanto da ‘qualidade’ do filme lacrimal – caso haja um desequilíbrio entre as camadas e/ou seus componentes, sua função poderá ficar prejudicada, gerando olhos mais ressecados. Entenderemos isso melhor na última seção do texto!
Sempre que avisar seu oftalmologista de que seu olho está seco, haverá uma detalhada análise fisiológica de seus olhos, a fim de avaliar as potenciais causas e buscar as estratégias de tratamento mais eficientes – que podem variar desde modificações nos hábitos de vida até o uso de colírios, lágrimas artificiais e pomadas anti-inflamatórias.
Quais são os fatores de risco?
Além do ar seco e frio do inverno, existem alguns fatores que aumentam o risco do ressecamento ocular, causando os olhos secos. São eles:
- idade: naturalmente, a produção de lágrimas diminui com o passar dos anos. Por isso, não é incomum idosos terem ‘olhos secos’. Usualmente, isso pode ser tratado sem grandes problemas pelo oftalmologista. No geral, a partir dos 50 anos, o número de casos aumenta;
- quem trabalha com telas também costuma relatar mais ‘olho seco’. Percebe-se que o uso de computadores e celulares reduz a quantidade de piscadas, e isso pode comprometer a lubrificação dos olhos A luz artificial emitida em alto brilho também pode ser um fator negativo para a visão. Não é à toa que já há pessoas chamando os olhos secos de “a principal doença ocular do século XXI”;
- o uso de lentes de contato, especialmente por tempo prolongado;
- manter o hábito de fumar;
- existem diversos problemas de saúde, de doenças a problemas ‘mecânicos’ nos olhos, que podem causar o olho seco, como: algumas doenças autoimunes, problemas na tireoide, deficiência de vitamina A e obstruções nas glândulas oculares;
- o uso de certos medicamentos também aumenta os riscos, como anticoncepcionais orais, antidepressivos, anti-histamínicos, diuréticos e reposição hormonal na menopausa;
- uma das cirurgias de correção de problemas oculares mais utilizada em todo o mundo – a LASIK – também é correlacionada a casos de olhos secos.
Cientistas não param de estudam os olhos secos
Olhos secos são um tema tão relevante em todo o mundo que, nos últimos anos, diversos estudos científicos buscaram entender como fatores externos podem influenciar sua incidência. Os resultados são interessantes e nos ajudam a traçar estratégias para evitar esse problema.
Temperatura
Dois estudos realizados recentemente mostraram que, conforme a temperatura do ambiente aumenta, também aumenta a espessura da camada mais externa do filme lacrimal – aquela que reduz a taxa de evaporação da lágrima. Em outras palavras: quanto mais quente o ambiente, maior a proteção anti-evaporação.
Pode-se dizer, com base nesses resultados, que durante o inverno, quando as temperaturas são menores, a camada externa do filme também está menor, o que pode colaborar para o ‘olho seco’ invernal? Ainda não se sabe, mas estes trabalhos fornecem pistas nesse sentido.
Umidade
Talvez nem seja necessário mencionar, mas diversas pesquisas nos últimos anos comprovaram que, realmente, os olhos secos estão intimamente relacionados à baixa umidade atmosférica, tanto em cenários externos quanto internos (comparando-se a saúde ocular de pessoas que trabalhavam em um mesmo prédio, mas em ambiente com e sem ar-condicionado). Quanto menor a umidade, menos proteção os olhos têm, e menor a qualidade e quantidade do filme lacrimal.
Poluentes
Dezenas de estudos analisaram, também, o impacto da qualidade do ar na presença de sintomas de olhos secos, encontrando forte correlação entre poluição e piora na saúde ocular.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, existem diversos gases cuja presença no ambiente desencadeia problemas nos olhos, como O3, NO2, SO2 e o monóxido de carbono (CO) – muitos deles são resultado da queima de combustíveis fósseis. A queima de combustíveis, aliás, gera micropartículas que ficam suspensas na atmosfera; quando entram em contato com os olhos, acredita-se que possam causar inflamação, stress e danos nas células oculares, além de reagiram com o filme lacrimal e reduzirem sua eficiência como protetor dos olhos.
Os estudos mostraram que quem vive em cidades ou regiões mais poluídas em termos atmosféricos era mais propenso a ter olhos secos.
Como se proteger?
Neste texto, você obteve um panorama sobre o que é o olho seco, seus sintomas e suas causas fisiológicas e ambientais. A partir dessas informações, já é possível imaginar o que fazer a fim de proteger os olhos e evitar os dolorosos sintomas de ‘secura’.
Em primeiro lugar: converse sempre com seu oftalmologista. Afinal, apenas a avaliação profissional será capaz de determinar as reais causas de seu problema de olhos secos (dentre as várias possíveis), indicando posteriormente os tratamentos mais adequados. De qualquer maneira, procure ajuda profissional sempre que perceber alterações nos olhos ou na qualidade da visão.
Caso trabalhe em escritórios, lojas ou locais com ar-condicionado, procure se instalar em posições em que não haja corrente de ar. Idealmente, a umidade interna deve ficar entre 30% e 50%, com temperaturas na faixa do 20ºC a 25ºC. Vale a pena também garantir a troca periódica dos filtros de ar e a instalação de purificadores, que ajudam a reduzir a quantidade de partículas suspensas e a melhorar a qualidade interna do ar.
Outra dica é evitar mudanças bruscas de temperaturas. Estudos apontam que, quanto maior a variação de temperatura que uma pessoa experimenta ao longo do dia, maiores os sintomas de olhos secos. Sendo assim, agora no inverno, agasalhe-se bem quando for sair para a rua, especialmente se estiver ventando. E no verão, caso fique bastante tempo em um ambiente com ar-condicionado, certifique-se de evitar sair diretamente ao sol e ao calor.
Falando ao sair ao sol, nos meses mais quentes, quando passeios ao ar livre são mais comuns, uma dica válida é investir em óculos de sol, que fornecem uma valiosa proteção – inclusive mecânica – para os olhos.
E para finalizar, medidas básicas de higiene, como lavar as mãos frequentemente, também podem ajudar a proteger a visão de infecções e contaminações, permitindo que o filme lacrimal se forme mais facilmente.
Como vimos, o olho é extremamente complexo. E muito, muito delicado. Quanto mais pudermos ‘ajudar’ essa estrutura tão importante do corpo a funcionar de forma segura, saudável e ‘úmida’, melhor!
Para saber mais:
- Resumo de estudos científicos sobre fatores ambientais para olho seco: Patel S, Mittal R, Kumar N, Galor A. The environment and dry eye-manifestations, mechanisms, and more. Front Toxicol. 2023 Aug 23;5:1173683. doi: 10.3389/ftox.2023.1173683. PMID: 37681211; PMCID: PMC10482047.